[O Velho News] Lista de Natal

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  • Date: Fri, 23 Dec 2005 11:47:30 -0200

 Um feliz natal à todos... boas festas e um 2006 de muitos acontecimentos
são meus sinceros desejos.

Jr!

 Lista de Natal

Por Frei Betto

    Neste Natal, não quero o Papai Noel das promoções comerciais, das ceias
pantagruélicas, dos presentes caros embrulhados em afetos raros. Quero o
Menino Jesus nascido no coração manjedoura, esperança acesa num pasto de
Belém, Maria a cantar que os abastados serão despedidos de mãos vazias e os
pobres saciados de bens.

    Não quero o Papai Noel das lojas enfeitadas, do celofane brilhante das
cestas de produtos importados, das garrafas em que os néscios afogam
tristezas rotuladas de alegrias. Quero o Menino palestino em busca de uma
terra onde nascer e viver, o Menino judeu arauto da paz na Terra aos homens
e mulheres de boa vontade, o Menino poupado da estupidez das guerras.

    Neste Natal dispenso abraços protocolares e sorrisos sob medida,
sentimentos retóricos e emoções que encobrem a aridez do coração. Quero o
amor sem dor, a oração só louvor, a fé comungada no sabor de justiça.

    Não quero presentes dos ausentes, a litúrgica reverência às mercadorias,
a romaria pagã aos templos consumistas dos shopping-centers. Quero o pão na
boca da criança faminta, a paz que se alarga dos espíritos atribulados aos
campos de batalha, o gozo de contemplar o Invisível.

    Neste Natal, não quero essa pavorosa troca de produtos entre mãos que
não se abrem em solidariedade, compaixão e carinho despudorado. Quero o
Menino solto no mais íntimo de mim mesmo, semeando ternura em todos os
canteiros em que as pedras sufocam as flores.

    Não quero esse ruído urbano que esmaga a alma, os ouvidos aprisionados
aos telefones, o olfato condenado por odores insalubres, a boca em cascatas
de palavras inúteis, despidas de verdade e sentido. Quero o silêncio
indevassável de meu próprio mistério, o canto harmônico da natureza, a mão
que se estende para que o outro se erga, a fraternura dos amigos abençoados
pela cumplicidade perene.

    Neste Natal, não me interessam as oscilações dos índices financeiros, as
promessas viciadas dos políticos, os cartões impressos a granel, cheios de
colorido e vazios de originalidade. Quero as evocações mais ternas: o cheiro
do café coado de manhã por minha avó, o som do sino da matriz, o rádio
Philco exalando sabonete Eucalol enquanto a babá me via brincar no quintal.

    Não quero as amarguras familiares que se guardam como poeira nas dobras
da alma, as invejas que me alienam de mim mesmo, as ambições que me tornam
tristes como as galinhas, que têm asas e não voam. Quero os joelhos dobrados
no átrio da igreja, a cabeça curvada ao Transcendente, a perplexidade de
José diante da gravidez inusitada de Maria.

    Neste Natal, não irei às ruas febris dos mercadores de bens finitos, nem
disfarçarei em algodão a neve que se amontoa em meus dessentimentos ou
prenderei falsas sinetas no frontispício de minha indiferença. Quero o
segredar dos anjos, a alegria desdentada de um pobre reconhecido em seu
direito, a euforia imaculada de um bebê acolhido em braços amados.

    Não viajarei para longe de mim mesmo, à procura de uma terra na qual eu
próprio me sinta estrangeiro, falando um idioma cujo significado me escapa.
Mergulharei no mais profundo de minha subjetividade, lá onde as palavras se
calam e a voz de Deus se faz ouvir como apelo e desafio.

    Neste Natal, não entupirei o meu verão de castanhas e nozes, panetones e
carnes gordas. Nem deixarei o que me resta de sensatez resvalar pelo gargalo
de uma bebida destilada. Porei sobre a mesa Deus fatiado em pão, a entornar
de vinho cálices alados, e convidarei à festa os famintos de
bem-aventuranças.

    Não rezarei pela bíblia dos que professam o medo, nem acenderei velas
aos guardiães do Inferno. Não serei o alpinista de cobiças desmedidas, nem o
coveiro de utopias libertárias. Desfraldarei sobre o telhado a bandeira de
sonhos inconfessos e semearei estrelas no jardim de meus encantos, lá onde
cultivo essa doce paixão que me faz sofrer de saudades do que é terno.

    Neste Natal, farei de minhas gravatas uma imensa corda para enforcar o
cinismo das convenções sociais e descerei um por um os degraus dos podres
poderes, até ingressar nos subterrâneos repletos de luz dos servos da
esperança. Não sonegarei sentimentos e encantos.

    Andarei nu pelas ruas para que todos vejam como o tempo enrugou
delicadamente a minha pele, imprimiu flacidez a esses membros prenhes de
história e cobriu-me de pêlos alvos como o frescor da velhice coerente.

    Não aceitarei os brindes de mãos que não se tocam, nem irei às ceias dos
que se devoram. Não comerei do bolo que empanturra corações e mentes, nem
deixarei que a aurora do Menino me surpreenda empanzinado de sono.

    Alimentado como um pássaro, sairei na noite feliz guiado pela estrela
dos magos; dançarei aleluias entre as galáxias da Via Láctea e, pela manhã,
em cada raio de sol injetarei poesia para que todos acordem inebriados como
se fossem borboletas livres do casulo.

    Neste Natal, não direi adeus ao século que finda e ao milênio que se
encerra, nos quais recebi a vida, a fé e mais perguntas que respostas.
Pisarei cuidadoso entre mortos inocentes e alentos frustrados, e haverei de
conferir no monitor eletrônico quantos foram os dissabores disseminados pela
fera disfarçada de humano.

    De mãos dadas com o Menino, deixarei que as águas lavem o avesso de
minha pele e, em seguida, caminharemos silentes rumo ao novo século e ao
terceiro milênio. E eu estarei com os olhos fixos no Menino para que seu
verbo se faça carne em meu coração de pedra, cuidando para que ele cresça
despregado da cruz, exaltado pela vitória inelutável da Ressurreição.

    Frei Betto é escritor, autor de "A Obra do Artista ­ uma visão holística
do Universo" (Ática), entre outros livros.

--
Junior Nascimento
mobile: 55 27 8818.3988
mail: roniuj@xxxxxxxxx
blog [um dia volta]: http://roniuj.blogspot.com
msn: roniuj@xxxxxxx

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