[Sistemas] 'Geração do diploma' lota faculdades, mas decepciona empresários

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  • Date: Fri, 11 Oct 2013 18:33:10 -0300

'Geração do diploma' lota faculdades, mas decepciona empresários

Ruth Costas

Da BBC Brasil em São Paulo

Atualizado em  9 de outubro, 2013 - 17:33 (Brasília) 20:33 GMT
[image: Estudante (Foto Reuters)]

Número de instituições de ensino superior mais que dobrou desde 2001

Nunca tantos brasileiros chegaram às salas de aula das universidades,
fizeram pós-graduação ou MBAs. Mas, ao mesmo tempo, não só as empresas
reclamam da oferta e qualidade da mão-de-obra no país como os índices de
produtividade do trabalhador custam a aumentar.

Na última década, o número de matrículas no ensino superior no Brasil
dobrou, embora ainda fique bem aquém dos níveis dos países desenvolvidos e
alguns emergentes. Só entre 2011 e 2012, por exemplo, 867 mil brasileiros
receberam um diploma, segundo a mais recente Pesquisa Nacional de Domicílio
(Pnad) do IBGE.

“Mas mesmo com essa expansão, na indústria de transformação, por exemplo,
tivemos um aumento de produtividade de apenas 1,1% entre 2001 e 2012,
enquanto o salário médio dos trabalhadores subiu 169% (em dólares)", diz
Rafael Lucchesi, diretor de educação e tecnologia na Confederação Nacional
da Indústria (CNI).

A decepção do mercado com o que já está sendo chamado de "geração do
diploma" é confirmada por especialistas, organizações empresariais e
consultores de recursos humanos.

"Os empresários não querem canudo. Querem capacidade de dar respostas e de
apreender coisas novas. E quando testam isso nos candidatos, rejeitam a
maioria", diz o sociólogo e especialista em relações do trabalho da
Faculdade de Economia e Administração da USP, José Pastore.

Entre empresários, já são lugar-comum relatos de administradores
recém-formados que não sabem escrever um relatório ou fazer um orçamento,
arquitetos que não conseguem resolver equações simples ou estagiários que
ignoram as regras básicas da linguagem ou têm dificuldades de se adaptar às
regras de ambientes corporativos.

"Cadastramos e avaliamos cerca de 770 mil jovens e ainda assim não
conseguimos encontrar candidatos suficientes com perfis adequados para
preencher todas as nossas 5 mil vagas", diz Maíra Habimorad,
vice-presidente do DMRH, grupo do qual faz parte a Companhia de Talentos,
uma empresa de recrutamento. "Surpreendentemente, terminanos com vagas em
aberto."

Outro exemplo de descompasso entre as necessidades do mercado e os
predicados de quem consegue um diploma no Brasil é um estudo feito pelo
grupo de Recursos Humanos Manpower. De 38 países pesquisados, o Brasil é o
segundo mercado em que as empresas têm mais dificuldade para encontrar
talentos, atrás apenas do Japão.

É claro que, em parte, isso se deve ao aquecimento do mercado de trabalho
brasileiro. Apesar da desaceleração da economia, os níveis de desemprego já
caíram para baixo dos 6% e têm quebrado sucessivos recordes de baixa.
[image: Linha de montagem da Ford (Foto BBC)]

Produtividade da industria aumentou apenas 1,1% na última década, segundo a
CNI

Mas segundo um estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisas Econômicas
Aplicadas (Ipea) divulgado nesta semana, os brasileiros com mais de 11 anos
de estudo formariam 50% desse contingente de desempregados.

"Mesmo com essa expansão do ensino e maior acesso ao curso superior, os
trabalhadores brasileiros não estão conseguindo oferecer o conhecimento
específico que as boas posições requerem", explica Márcia Almstrom, do
grupo Manpower.
Causas

Especialistas consultados pela BBC Brasil apontam três causas principais
para a decepção com a "geração do diploma".

A principal delas estaria relacionada a qualidade do ensino e habilidades
dos alunos que se formam em algumas faculdades e universidades do país.

Os números de novos estabelecimentos do tipo criadas nos últimos anos
mostra como os empresários consideram esse setor promissor. Em 2000, o
Brasil tinha pouco mais de mil instituições de ensino superior. Hoje são
2.416, sendo 2.112 particulares.

"Ocorre que a explosão de escolas superiores não foi acompanhada pela
melhoria da qualidade. A grande maioria das novas faculdades é ruim", diz
Pastore.

Tristan McCowan, professor de educação e desenvolvimento da Universidade de
Londres, concorda. Há mais de uma década, McCowan estuda o sistema
educacional brasileiro e, para ele, alguns desses cursos universitários
talvez nem pudessem ser classificados como tal.

“São mais uma extensão do ensino fundamental", diz McCowan. "E o problema é
que trazem muito pouco para a sociedade: não aumentam a capacidade de
inovação da economia, não impulsionam sua produtividade e acabam ajudando a
perpetuar uma situação de desigualdade, já que continua a ser vedado à
população de baixa renda o acesso a cursos de maior prestígio e qualidade."

Para se ter a medida do desafio que o Brasil têm pela frente para expandir
a qualidade de seu ensino superior, basta lembrar que o índice de
anafalbetismo funcional entre universitários brasileiros chega a 38%,
segundo o Instituto Paulo Montenegro (IPM), vinculado ao Ibope.
[image: Estudantes (Foto BBC)]

Especialistas questionam qualidade de novas faculdades no Brasil

Na prática, isso significa que quatro em cada dez universitários no país
até sabem ler textos simples, mas são incapazes de interpretar e associar
informações. Também não conseguem analisar tabelas, mapas e gráficos ou
mesmo fazer contas um pouco mais complexas.

De 2001 a 2011, a porcentagem de universitários plenamente alfabetizados
caiu 14 pontos - de 76%, em 2001, para 62%, em 2011. "E os resultados das
próximas pesquisas devem confirmar essa tendência de queda", prevê Ana
Lúcia Lima, diretora-executiva do IPM.

Segundo Lima, tal fenômeno em parte reflete o fato da expansão do ensino
superior no Brasil ser um processo relativamente recente e estar levando
para bancos universitários jovens que não só tiveram um ensino básico de má
qualidade como também viveram em um ambiente familiar que contribuiu pouco
para sua aprendizagem.

"Além disso, muitas instituições de ensino superior privadas acabaram
adotando exigências mais baixas para o ingresso e a aprovação em seus
cursos", diz ela. "E como consequência, acabamos criando uma escolaridade
no papel que não corresponde ao nível real de escolaridade dos brasileiros."
Postura e experiência

A segunda razão apontada para a decepção com a geração de diplomados
estaria ligada a “problemas de postura” e falta de experiência de parte dos
profissionais no mercado.

“Muitos jovens têm vivência acadêmica, mas não conseguem se posicionar em
uma empresa, respeitar diferenças, lidar com hierarquia ou com uma figura
de autoridade”, diz Marcus Soares, professor do Insper especialista em
gestão de pessoas.

“Entre os que se formam em universidades mais renomadas também há certa
ansiedade para conseguir um posto que faça jus a seu diploma. Às vezes o
estagiário entra na empresa já querendo ser diretor.”

As empresas, assim, estão tendo de se adaptar ao desafio de lidar com as
expectativas e o perfil dos novos profissionais do mercado – e em um
contexto de baixo desemprego, reter bons quadros pode ser complicado.

Para Marcelo Cuellar, da consultoria de recursos humanos Michael Page, a
falta de experiência é, de certa forma natural, em função do recente ciclo
de expansão econômica brasileira.

"Tivemos um boom econômico após um período de relativa estagnação, em que
não havia tanta demanda por certos tipos de trabalhos. Nesse contexto, a
escassez de profissionais experientes de determinadas áreas é um problema
que não pode ser resolvido de uma hora para outra", diz Cuellar.

Nos últimos anos, muitos engenheiros acabaram trabalhando no setor
financeiro, por exemplo.

"Não dá para esperar que, agora, seja fácil encontrar engenheiros com dez
ou quinze anos de experiência em sua área – e é em parte dessa escassez que
vem a percepção dos empresários de que ‘não tem ninguém bom’ no mercado",
acredita o consultor.
'Tradição baicharelesca'

Por fim, a terceira razão apresentada por especialistas para explicar a
decepção com a “geração do diploma” estaria ligada a um desalinhamento
entre o foco dos cursos mais procurados e as necessidades do mercado.

De um lado, há quem critique o fato de que a maioria dos estudantes
brasileiros tende a seguir carreiras das ciências humanas ou ciências
sociais - como administração, direito ou pedagogia - enquanto a proporção
dos que estudam ciências exatas é pequena se comparada a países asiáticos
ou alguns europeus.

“O Brasil precisa de mais engenheiros, matemáticos, químicos ou
especialistas em bioquímica, por exemplo, e os esforços para ampliar o
número de especialistas nessas áreas ainda são insuficientes”, diz o
diretor-executivo da Câmara Americana de Comércio (Amcham), Gabriel Rico.

Segundo Rico, as consequências dessas deficiências são claras: “Em 2011 o
país conseguiu atrair importantes centros de desenvolvimento e pesquisas de
empresas como a GE a IBM e a Boeing”, ele exemplifica. “Mas se não há
profissionais para impulsionar esses projetos a tendência é que eles percam
relevância dentro das empresas.”

Do outro lado, também há críticas ao que alguns vêem como um excesso de
valorização do ensino superior em detrimento das carreiras de nível técnico.

“É bastante disseminada no Brasil a ideia de que cargos de gestão pagam bem
e cargos técnicos pagam mal. Mas isso está mudando – até porque a demanda
por profissionais da área técnica tem impulsionado os seus salários”, diz o
consultor.

Rafael Lucchesi concorda. "Temos uma tradição cultural baicharelesca, que
está sendo vencida aos poucos”, diz o diretor da CNI – que também é o
diretor-geral do Senai (Serviço Nacional da Indústria, que oferece cursos
técnicos).

Segundo Lucchesi, hoje um operador de instalação elétrica e um técnico
petroquímico chegam a ganhar R$ 8,3 mil por mês. Da mesma forma, um técnico
de mineração com dez anos de carreira poderia ter um salário de R$ 9,6 mil
- mais do que ganham muitos profissionais com ensino superior.

“Por isso, já há uma procura maior por essas formações, principalmente por
parte de jovens da classe C, mas é preciso mais investimentos para suprir
as necessidades do país nessa área”, acredita.



Fonte:
http://www.bbc.co.uk/portuguese/noticias/2013/10/131004_mercado_trabalho_diplomas_ru.shtml?print=1
-- 
“Contos de Fadas são a pura verdade: não porque nos contam que os dragões
existem, mas porque nos contam que eles podem ser vencidos. (G. K.
Chesterton)”

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