[Nefelibatas] Minas Enigma (Fernando Sabino)

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  • Date: Fri, 15 Oct 2004 16:20:07 -0300

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Minas Enigma 

  

Fernando Sabino 

  

  Minas além do som, Minas Gerais 

   Carlos Drummond de Andrade 

  

  

Se sou mineiro? Bem, é conforme, dona. (Sei lá por que ela está
perguntando?)Sou de Belzonte, uai. 

  

Tudo é conforme. Basta nascer em Minas para ser mineiro? Que diabo é ser
mineiro, afinal? Inglês misturado com oriental? É fumar cigarro de palha,
como o poeta Emílio, de Dores do Indaiá? Autran fuma cachimbo. Tem até quem
fume cigarro americano. (No bairro do Calafate havia uma fábrica de
"Camel".)Em suma: ser mineiro é esperar pela cor da fumaça. É dormir no chão
para não cair da cama. É plantar verde pra colher maduro. É não meter a mão
em cumbuca. Não dar passo maior que as pernas. Não amarrar cachorro com
lingüiça. 

  

Porque mineiro não prega prego sem estopa. Mineiro não dá ponto sem nó.
Mineiro não perde trem. 

  

Mas compra bonde. 

  

Compra. E vende pra paulista. 

  

Evém mineiro. Ele não olha: espia. Não presta atenção: vigia só. Não
conversa: confabula. Não combina: conspira. Não se vinga: espera. Faz parte
do decálogo, que alguém já elaborou. E não enlouquece: piora. Ou declara,
conforme manda a delicadeza. No mais, é confiar desconfiando. Dois é bom,
três é comício. Devagar que eu tenho pressa. 

  

Apólogo mineiro: o boi velho e o boi jovem, no alto do morro - lá embaixo
umaporção de vacas pastando. O boizinho, incontido: 

  

- Vamos descer correndo, correndo e pegar umas dez? 

  

E o boizão, tranqüilamente: 

  

- Não: vamos descer devagar, e pegar todas. 

  

Mais vale um pássaro na mão. A Academia Mineira, há tempos, pagava um jeton
ridículo: duzentos cruzeiros - antigos, é lógico. Um dos imortais,
indignado,discursava o seu protesto: 

  

- Precisamos dar um jeito nisso! Duzentos cruzeiros é uma vergonha! Ou
quinhentos cruzeiros, ou nada! 

  

Ao que um colega prudentemente aparteou: 

  

- Pera lá: ou quinhentos cruzeiros, ou duzentos mesmo. 

  

  

Quem nasce em Três Corações é tricordiano - haja vista Pelé. Quem nasce em
Barbacena tem de escolher a Maternidade: ou é do Zezinho ou do Bias. E a
Manchester Mineira, terra do Murilo Mendes? O poeta Nava foi-se embora:
"parabéns a Pedro Nava, parabéns a Juiz de Fora". Itabira, calçada de ferro:
não aceitou chamar-se Presidente Vargas, continuou digna do itabirano
Carlos.E Ouro Preto continua digna de ser vista: ali é a casa do Rodrigo;
Renato de Lima, ex-delegado e pianista amador, pintando junto à Casa dos
Contos. Afonso é de Paracatu. Em Sabará nasceram Lúcia e Aníbal, além de
outros ilustres Machados. Alphonsus, o solitário de Mariana. Os profetas de
Congonhas. A cidade de Tiradentes - o que não tinha barbas. O Aleijadinho
nãotinha mãos. São João del Rei, onde nasceu Otto, o que morrerá batendo
papo. Solidário só no câncer? Absolutamente, dona: nas virtudes também, uai.
Haja vista a Tradicional Família Mineira, que Deus a tenha. As estações de
águas: lembrança de São Lourenço, escrito num copinho. E Lambari, terra de
Henriqueta! Monte Santo tem a rua mais iluminada do mundo. E uma ambulância
com sirene, que seu filho Castejon arranjou. Itaúna fica num quarto andar do
Leblon, no apartamento de Marco Aurélio, o bom. Jeremias, outro bom, mineiro
como Ziraldo. Os bonecos de Borjalo só ganharam boca depois que começaram a
falar. Mineiro por todo lado! O poeta Pellegrino, como psiquiatra, tem
garantida uma numerosa clientela. Amílcar modela Minas em arame. Paulo
encontrou Minas depois que saiu de lá. João Leite levou-a para São Paulo,
Alphonsus para Brasília, Guilhermino para o Sul. João Camilo ficou. Etiene
voltou. Paulo Lima voltou. Iglezias voltou. Jaques voltou.Figueiró continua,
Rubião recomeçou. 

  

Um Estado de nariz imenso, um estado de espírito: um jeito de ser. Manhoso,
ladino, cauteloso, desconfiado - prudência e capitalização. 

  

O guarda-chuva da proteção financeira, não como lema do Banco do Magalhães
mais o Zé Luís, e sim como regra de conduta: 

  

- Meu filho, ouça bem o seu pai: se sair à rua, leve o guarda-chuva, mas não
leve dinheiro. Se levar, não entre em lugar nenhum. Se entrar, não faça
despesas. Se fizer, não puxe a carteira. Se puxar, não pague. Se pagar,
paguesomente a sua. 

  

  

  

Mas todos os princípios se desmoronam diante de um lombo de porco com
rodelasde limão, tutu de feijão com torresmos, lingüiça frita com farofa. De
sobremesa, goiabada cascão com queijo palmira. Depois, cafezinho requentado
com requeijão. Aceita um pão de queijo? biscoito polvilho? brevidade? ou
quemsabe uma broinha de fubá? Não, dona, obrigado. As quitandas me
apertencem, mas prefiro bolinho de januária, e pronto: estou sastifeito... 

  

É a hora e a vez de Guimarães Rosa sorrir e dizer pra cumpadre meu Quelemén:
perigoso nada, mira e veja, nas Gerais, essas coisas... 

  

Falar de Minas, trem danado, sô. É falar no mundo misterioso de Lúcio
Cardoso, Cornélio Pena ou Rosário Fusco, no mundo irônico, esquivo ou
pitoresco de Cyro dos Anjos, Oswaldo Alves, Mário Palmério, seus
romancistas.E num mundo de gente, seus personagens, que vão de Antônio
Carlosa Milton Campos, de Bernardes a Juscelino - vasto mundo! ah, se eu me
chamasse Raimundo. Dentro de mim uma corrente de nomes e evocações antigas,
fluindo como o Rio das Velhas no seu leito de pedras, entre cidades
imemoriais. Leopoldina, doce de manga, terra de meus pais... Prefiro
estancá-las no tempo, a exaurir-me em impressões arrancadas aos pedaços, e
que aos poucos descobririam o que resta de precioso em mim - o mistério da
minha terra, desafiando-me como a esfinge com o seu enigma: decifra-me , ou
devoro-te. 

  

Prefiro ser devorado. 

  

  

  

(Texto extraído do livro "A Inglesa Deslumbrada", Editora Record - Rio de
Janeiro, 

1967, pág. 71, em homenagem ao autor falecido recentemente.) 

  

  

  

  

  

  




"Perdoe sempre a seus inimigos; não há maneira melhor para irritá-los." Oscar 
Wilde


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         Grupo de Analistas Legislativos da Câmara dos Deputados
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