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Em 7 de abr de 2018, às 19:45, Niquele <niquele@xxxxxxxxx> escreveu:
O Brasil está à beira de um ataque de loucura?
É nos momentos sombrios de uma sociedade desorientada e envenenada por ódios
políticos que é mais fácil se esconderem e prosperarem as forças ocultas mais
perigosas e violentas
JUAN ARIAS
3 ABR 2018 - 23:14 CEST
Será que a política enlouqueceu? A Justiça perdeu a bússola? A sociedade
adoeceu? Drogamo-nos todos com o veneno da irracionalidade? O Brasil que
encontrei ao chegar aqui há quase 20 anos e que me conquistou como uma
namorada com sua placidez humana, parece hoje à beira de um ataque de
loucura. É como se todos tivessem combinado, ao mesmo tempo, de se odiar,
confrontar, acusar e até agredir fisicamente. Parece a conjunção de um
terremoto e um incêndio. Tudo treme e tudo arde, enquanto a sensatez, a
reflexão, o diálogo, o respeito pela diversidade e a empatia pelas ideias
alheias se escondem envergonhados.
É difícil, em meio às chamas, manter a cabeça fria antes de tomar uma decisão
sensata. E, no entanto, o Brasil está precisando parar por um instante para
se perguntar quais são os demônios que o estão tentando e arrastando para um
caminho que parece sem saída e que pode conduzi-lo a um abismo perigoso.
Ou os brasileiros, todos, de qualquer ideologia ou credo religioso, entendem
que o que se precisa é uma pausa de serenidade, de lucidez humana e política
ou acabarão devorando-se sem saber, no final, por quê nem para quê, já que
essa irritação e esse desassossego não parecem condizer com sua identidade
mais íntima. Conheço um pouco os brasileiros para entender que o que lhes dá
prazer é o gosto pela vida, pela amizade, pela alegria de estar juntos. Nunca
foram filhos prediletos da guerra.
Entretanto, um observador que chegasse de fora encontraria uma sociedade em
carne viva, penetrada pelos instintos mais baixos que correm soltos pelas
redes. Poderia pensar que se trata de um povo que perdeu a direção. Como
entender que um personagem messiânico como o ex-presidente Lula, que foi
orgulho dentro e fora do país, se transformou de repente no monstro a abater,
centro de todas as brigas, objeto de todas as rixas jurídicas, capaz de
despertar os piores instintos?
Como entender, ao mesmo tempo que Lula e seu partido, que chegaram ao poder
embalados pelo mantra de paz e amor, diálogo e a reconciliação, dividam a
sociedade entre “nós e eles”, bons e maus e ameacem fazer uso do exército dos
Sem Terra? Precisava Lula, no meio de um processo judicial, condenado por
corrupção, ameaçar os juízes de levá-los à prisão se voltasse ao poder?
Precisavam personagens que gozam do prestígio da sociedade por sua luta
contra a corrupção, como o procurador Deltan Dallagnol ou o juiz do Rio,
Marcello Bretas, lançar mão de suas crenças religiosas, do temor a Deus, e
anunciar jejuns espirituais para pedir a prisão de Lula?
E o Supremo, que deveria ser o fulcro da segurança constitucional, precisava
abrir entre seus magistrados uma guerra pessoal, dividir-se em bandos
políticos e transformar um simples e legal habeas corpus como o de Lula em
uma batalha e em uma desculpa para tentar reabrir a discussão sobre a
possibilidade de começar a cumprir pena depois da condenação em segunda
instância? É impossível que a sociedade, também ela envenenada, não veja na
manobra a mão negra para dar um golpe no Lava Jato, o ogro dos grandes
corruptos que sonham “estancar a sangria”?
Como também é verdade que a sociedade não pode querer impor seus gostos a um
tribunal supremo cuja liberdade de decisão deve ser sagrada e goza do direito
constitucional de emitir, em liberdade, vereditos que devem ser respeitados
pelos outros poderes.
E para a sociedade é difícil entender, por exemplo, dentro da administração
da Justiça, por que dezenas de políticos estão sendo condenados nos tribunais
de primeira e segunda instância, enquanto entre os que gozam de foro
privilegiado e são julgados pelo Supremo nenhum foi condenado, nem da
esquerda nem da direita.
Correm provocações por toda parte e por todas as instâncias e a sociedade
acaba atolada nessa loucura institucional com o perigo de querer fazer
justiça com as próprias mãos. Ou alguém detém essa corrida para a exasperação
de tudo que nos rodeia, sem árbitros capazes de fazer uma chamada ao bom
senso e à reflexão, ou corremos o risco de dar de cara com uma ruptura
institucional ou uma incredulidade da sociedade nos poderes e nas leis que
devem regê-la.
Estamos a poucos meses de eleições consideradas cruciais, com uma carga de
incerteza que há quem aposte que não serão realizadas ou serão invalidadas,
sobretudo se de um modo ou de outro, a Justiça eleitoral não decidir com
serenidade e com a lei na mão, o destino da candidatura emblemática e
paradoxal de Lula, o candidato com maior número de consensos e hoje
impossibilitado de disputar as eleições devido a sua condenação a 12 anos de
prisão.
É nos momentos sombrios de uma sociedade desorientada e envenenada por ódios
políticos que é mais fácil se esconderem e prosperarem as forças ocultas mais
perigosas e violentas, capazes como ninguém de conspirar nas sombras e nas
águas turvas onde sabem mover-se melhor que ninguém.
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Niquele